domingo, 15 de outubro de 2017

CONSIDERAÇÕES ACERCA DA PROBLEMÁTICA DO MAL EM SANTO AGOSTINHO

Evanildo Augusto da Silva*
CONSIDERAÇÕES ACERCA DA PROBLEMÁTICA DO MAL EM SANTO AGOSTINHO

INTRODUÇÃO

O fio condutor de nosso texto é a problemática do mal em Agostinho, e desejamos entender o essencial de seu pensamento neste particular. Naturalmente na dimensão própria da monografia, permitimo-nos guiar por autores conhecidos.
Selecionamos o presente tema, a partir de reflexões nossas, ao longo do curso de filosofia. Sempre despertava nossa atenção o que os diversos autores iam dizendo  sobre o lugar do mal no cosmos:
Em  Platão, se o mundo sensível é réplica do mundo inteligível, por que o mal?
Em Agostinho, se Deus criou todas as coisas boas, por que o mal?
Em Leibniz, se este é o melhor dos mundos possíveis, por que o mal?
Estas dificuldades perduram até os nossos dias. Sendo pois o problema atual, optamos por dedicar a ele um esforço um pouco mais acurado. E, sendo Agostinho um autor que se posta no limiar mesmo da Cultura Ocidental e, portanto, chave para sua compreensão, elegemo-lo como tema, pela sua importância se não única, pelo menos irrecusável, ao lado de outros como poderiam ser Platão, Kant, etc.  Também preocupação ingente de nossos dias é a questão social, que não é estranha à reflexão de Agostinho, o que reforça nossa escolha. 
Ao longo da história aparecem quatro tipos de linhas de raciocínio sobre o problema do mal[1]:
Ø  Visão ontológica: mal é nada  - metafisicamente não existe o mal;
Ø  Visões  “centradas em Deus”  - uma admite a existência do mal como princípio independente; e a outra, considera que Deus não pode agir errado e, portanto, tudo o que faz é bom. Assim, tudo existe na esfera do bem, de uma certa forma o mal também é um bem em si mesmo;  
Ø  Visão “centrada no homem” – afirma a idéia de que a bondade seria menor valor se fosse parte inalienável da natureza do homem.
Quanto à realização do trabalho, preferimos dividi-lo em duas partes: histórica e sistemática. Na primeira parte, desenvolveremos um capítulo onde faremos considerações acerca do contexto histórico e um breve percurso de vida e obras do nosso autor, onde poderemos observar que  sua  filosofia surge de sua realidade existencial. História é o viver no tempo. Assim, a história influencia sobre diversos aspectos a conduta humana. Na parte sistemática, desenvolveremos dois capítulos. No primeiro exporemos alguns pressupostos básicos à compreensão do pensamento de Agostinho, como sua concepção sobre Deus, homem, alma, liberdade e livre-arbítrio. Estas concepções estabelecem relações com o tema central do trabalho. No segundo, o problema do mal, no que se refere a sua origem, causalidade e entendimento, em três níveis: o mal ontológico-metafísico; o mal moral e o mal físico, procurando não perder de vista a articulação deste tema com outras bases do pensamento agostiniano.

PARTE HISTÓRICA

I. CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICA

1. Situação histórica

O homem é um ser histórico e sócio-cultural, que vive  em um espaço e tempo dados. Nosso meio cultural nos propicia o desenvolvimento e a realização das capacidades. Por isso, o conhecimento do ambiente (lugar) e do momento histórico  (tempo) bem como das condições sócio-culturais é fator de bastante importância para a compreensão do pensamento de alguém. Assim sendo, a necessidade de  situarmos o autor a quem nos propusemos dedicar a atenção, leva-nos a correr os olhos sobre a Grécia, Roma e África, regiões que abrigaram Agostinho do ponto de vista civil e intelectual. 
Já o século III é marcado pela transição da filosofia greco-romana à cristã. Podemos ver uma forte desarmonia provinda da mescla, no âmbito do Império, das influências religiosas dos povos conquistados. O Orientalismo, o crescimento das superstições, a reverência exagerada pelo passado, profunda modificação da ética pagã mais antiga e o intenso individualismo da vida contemplativa, são todos fenômenos que têm sua explicação no desenraizamento das nacionalidades e culturas. Surgem a teosofia e a magia, no campo das superstições, a astrologia tem a primazia. Os mitos que têm sido o caminho para a “paidéia”, a educação do povo, estão bem desacreditados.
Durante esse século, no ano de 244,  Plotino chega a Roma. Ele nada pronuncia a respeito do cristianismo.  Este silêncio não quer dizer necessariamente ignôrancia, pois já se destacam a seu tempo, Clemente de Alexandria e Orígenes. Portanto, o seu silêncio deve ser deliberado. E tanto o neo-platonismo, que Plotino representa, como o cristianismo vão procurar âncoras mais firmes para o soerguimento moral dos cidadãos e do Império.
De fato, a filosofia, ao tentar reaver seu processo de busca de respostas e explicações para o viver humano readquire um vigor maior, com as elaborações dos neoplatônicos. Concomitante a este momento de retomada do esforço filosófico-reflexivo, entra em cena o cristianismo, oferecendo suas respostas às aspirações fundamentais do ser humano. Ele propõe uma nova escala de valores, baseando-se na soteriologia e escatologia. Neste diapasão, o que valoriza o homem não é o mero fato de ser habitante da pólis, mas o fato de viver um modelo de fraternidade, com base na convicção de estar seguindo a vontade de Deus.
Em 313, com o Edito de Milão, Constantino, decreta liberdade de culto aos cristãos. Essa atitude é uma estratégia que visa a unidade do Império onde a Igreja já exerce enorme influência. Em 380, Teodósio decreta o Cristianismo religião oficial do Estado.
O Cristianismo se expande pelo Império Romano, atingindo assim a África proconsular.  Aurélio Agostinho nasce sob estas influências.

2. Vida e obras

Aurélio Agostinho nasceu a 13 de novembro de 354 em Tagaste[2], filho de Patrício e Mônica. Patrício é um “cidadão modesto”[3]. Faz parte do conselho municipal, é homem ambicioso, mas não possui muita terra. Mônica é admirável pela nobreza de caráter, pelo esplendor da virtude, senhora de grande fé[4]. O casal teve mais dois filhos: um menino, Navígio, e uma menina cujo nome se ignora.
Patrício faz de tudo para oferecer ao filho mais velho uma excelente educação. Nesse intuito, no ano de 367, envia-o a Madaura[5], onde conclui o curso de humanidades. Em 369, retorna Agostinho a Tagaste e aguarda a possibilidade de dar continuidade a seus estudos em Cartago[6]. Estando em Cartago para estudar retórica que compreendia o estudo das artes liberais, deveria aprender  o grego e aperfeiçoar o latim. “Gostava muito da língua latina, não da que ensinavam os primeiros mestres, mas da que lecionavam os gramáticos”[7]. Apresenta no entanto, aversão à língua grega[8]. Isto lhe dificultará a leitura dos clássicos gregos no original. Um ano depois de ter chegado a Cartago une-se a uma concubina com quem tem um filho de nome Adeodato.
No decorrer do curso, lê o livro de Cícero, Hortênsio. Este muda “o alvo de suas afeições”[9] e desperta-o ao amor à sabedoria, o que em grego é chamado de “ filosofia”. Identifica a sabedoria com Deus e o sábio com aquele que imita e ama a Deus.
Depois de ler Hortênsio, passa, coerentemente, a buscar uma filosofia que lhe atenda os anseios.  Sua primeira experiência é com o maniqueísmo[10], no qual acredita poder encontrar explicações mais racionais sobre o problema do mal.  Outra opção seriam as escrituras cristãs, mas aí não encontrava respostas a suas aspirações e além disso, diz ele mesmo,  “a sua simplicidade repugnava ao meu orgulho e a luz da minha inteligência não lhe penetrava no íntimo”[11].
Agostinho permanece no maniqueismo por nove anos. Desejando sanar dúvidas, tem um encontro com Fausto, um mestre na seita. O encontro provoca-lhe grande desapontamento, porque percebe-o muito superficial. Decepcionado, decide abandonar os maniqueus, uma vez que o problema do mal continua ainda sem solução. Torna-se cético e desliga-se do grupo[12]. Parte para Roma para lecionar retórica, depois de algum tempo, transfere-se para Milão. Como era conhecida a retórica do Bispo Ambrósio, foi ouvi-lo com o intuito de perceber a sua técnica quanto à dicção, à forma e à estrutura[13]. Percebe que o discurso de Ambrósio é bem mais fundamentado do que o de Fausto.
Lê “As dez categorias” de Aristóteles e tem contato com algumas obras dos platônicos. Lê  obras de dois acadêmicos do século III: Plotino e Porfírio. Obras traduzidas nos meados do século IV por Mário Vitorino[14].
Converte-se ao Cristianismo em 386, fazendo-se batizar na Vigília da Páscoa do ano seguinte. Desejando aprofundar no Cristianismo, a busca da verdade, enquanto reflexão filosófica (na amizade de Deus), no mesmo  ano, parte para Cassicíaco[15], acompanhado por um grupo de pessoas que almejam o mesmo ideal. Neste momento, a partir das reflexões feitas com os amigos, surgem as primeiras obras, como:
Ø  Contra Academicos –  onde examina o conceito de sabedoria; expõe a doutrina dos acadêmicos e oferece uma refutação da mesma.
Ø  De Beata Vita – mostra que a verdadeira felicidade não se encontra senão na verdade divina e na fruição de Deus.
Ø  De Ordine - trata do problema do mal e do caráter universal da providência divina.
Ø  Soliloquia – aborda o problema do conhecimento, das qualidades do sábio e da verdade. É um colóquio com a própria razão.
Posteriormente, O "Mestre do Ocidente", escreve vasta produção, que se divide em obras filosóficas, polêmicas, exegéticas, teológicas, autobiográficas, sermões e epístolas. Os livros dele são todos importantes, mas citaremos apenas seis que se nos apresentam fundamentais: Confessiones (texto autobiográfico de capital importância); Retractationes (Preciosa revisão de suas obras); De Doctrina Christiana (Principal exposição do método exegético seguido por ele); De Trinitate    (Importante Tratado Teológico sobre o mistério da fé Cristã); De Civitate Dei  (Elaboração da teoria das duas cidades e da concepção Cristã da história) e De Líbero Arbitrio (Obra fundamental para se perceber a problemática da liberdade, livre arbítrio e o mal).
Agostinho morre, em 430, como bispo de Hipona[16]. Sua cidade estava cercada por vândalos, um povo germânico, que, junto com outros ditos “bárbaros” devastavam o Império Romano.
Este percurso histórico, conquanto sumário, ajuda-nos a situar no tempo e no espaço, o autor que ora estudamos e espera facilitar a compreensão de alguns temas agostinianos; principalmente o problema do mal que é o tema de nosso trabalho. Para melhor apreendermos a reflexão de Agostinho, faremos um breve percurso nos pressupostos filosóficos que serão expostos a seguir.

PARTE SISTEMÁTICA

II. EXPOSIÇÕES SUMÁRIAS DO PENSAMENTO DE AGOSTINHO

1. Alguns pressupostos agostinianos

O pensamento agostiniano se constrói a partir das concepções adquiridas anteriormente, pelas leituras de Platão, de Aristóteles, de alguns neoplatônicos e, naturalmente e sobretudo pela Tradição cristã – a Sagrada Escritura.  Ao iniciar seu itinerário filosófico, Agostinho abre uma via própria que é a interioridade – via introspectiva – no anseio de encontrar a verdade no próprio interior. Como ele mesmo nos afirma: Noli foras ire, in teipsum redi, in interiore homine habitat veritas[17]. A via da interioridade não é desvinculada do pensar. Nem sequer trata-se de mera análise existencial.  É antes uma via transcendental e metafísica, fundada em um método que, baseados em Mondin[18], podemos chamar de “interiorístico-transcendental". Agostinho resume este método com o brocardo noverim me, noverim te[19] que pretende ter o seguinte significado:  o "Eu" é colocado como pressuposto do conhecimento do próprio Deus, pois o "Eu" existe por alguma forma de participação no ser divino, que é absoluto. Portanto, conhecendo-se o "Eu",  de alguma forma conhece-se a Deus, que é o autor deste "Eu". Iluminada pela metafísica, esta  torna-se uma via de acesso à aspiração maior do homem, que é o conhecimento do ser.
Agostinho se declara desejoso de “conhecer a Deus e a alma e nada mais”[20]. Assim, desenvolverá o seu pensamento tendo como pano de fundo a fé bíblica, mas numa metodologia legitimamente filosófica, como é reconhecido.  Como pensador, faz-se atual por manifestar preocupações antropológicas e éticas.
Trabalhando o problema do mal, percebemos ser de capital importância conhecer a sua concepção de Deus,  homem, alma, liberdade e livre-arbítrio. Estas concepções nos auxiliarão nos futuros esclarecimentos acerca do problema central de nosso trabalho.

2. Deus

Tarde vos amei, ó Beleza tão antiga e tão nova, tarde vos amei! Eis que habitáveis dentro de mim, e eu  lá fora a procurar-vos! (Conf. X,27)
Na busca da compreensão de Deus, Agostinho o identifica com a Verdade, quando afirma que “quem conhece a Verdade, conhece a Luz Imutável, e quem a conhece, conhece a eternidade”[21]. Dentre os atributos de Deus, neste momento destacamos dois: Imutabilidade e Eternidade. “Imutável” porque é a realidade plena e total e “eterno” porque está isento de relação temporal e nele todo o tempo é presente[22]. Mas entre todos os nomes que lhe podemos atribuir, um designa de forma mais sublime. Trata-se do nome Esse (Ser). Essa designação é a mais perfeita, porque esse termo lembra-nos o Sumo Ser na sua Imutabilidade, infinitude e incorruptibilidade. Segundo Gilson, Agostinho descreve atributos de Deus e afirma que Ele é imortal, imutável, Ser Supremo, Sumo Ser ou essência por excelência, e isto é dizer a mesma coisa[23]. Os atributos  nos mostram a impossibilidade de estar em Deus a raiz e a origem do mal.
Na visão agostiniana, o homem ao buscar a filosofia, busca na verdade, a fruição da felicidade que é dada por Deus. Para Agostinho, a  eudaimonia é a vida feliz, na alegria que provém da Verdade[24]. Conhecer a Deus é condição essencial para se viver uma vida feliz.
Na  concepção de Agostinho Deus não é visto como um dos princípios, mas como o princípio fundamental  transcendente, o único capaz de dar existência aos seres. Assim, somente Deus é o princípio do ser, a verdade do saber e a felicidade do viver[25] que se dá no homem.
Desejando conhecer Deus, deseja conhecer o princípio fundamental das coisas, pois tudo o que é, na sua  concepção, é criado   ex nihilo por Deus, criador, regedor e administrador do mundo[26]. Podemos mencionar a diferença entre gerar, fabricar e criar. Criar implica tirar do nada. Gerar ou fabricar significa dar forma diferente àquilo que já existe. Somente Deus pode criar. Tudo o que é criado por Ele tem por finalidade o bem[27], pois o ser comunica o que é, Ele é o “Bem Inefável”[28]. Logo, somente Deus pode comunicar o Bem. Segue-se que toda a criação é um bem em si mesmo, porque originada daquele que é realidade plena e total – Ego sum qui sum (Ex 3,14). A afirmação do criar, em detrimento do "gerar” e do "fabricar", revela uma dependência exclusiva dos seres materiais com relação a Deus, que não dependeu de uma matéria primordial (como seria no fabricar), mas que, ao mesmo tempo são radicalmente diferentes dele (o que não seria no "gerar"). Se dependem de Deus para ser, então são boas as criaturas. Se lhe são diversas, então, têm espaço para o mal.

3. Homem 

O homem foi criado para atingir, pela excelência do ser, o Ser por excelência.       (De Civ. Dei VIII,4)
A antropologia agostiniana não se centra basicamente na natureza ou na relação homem-cosmos, como entre os gregos, mas sim nas dimensões da escatologia e soteriologia , isto é, numa percepção especial  da relação entre Deus e  o homem. O homem é uma criação de Deus, dotado de corpo e alma, razão e inteligência[29].
 Para o platonismo a relação entre alma e corpo é acidental, não se admitindo a unidade substancial entre os dois elementos. A antropologia agostiniana nos  afirma  que  “o  corpo  se  une  à  alma  para formar e constituir o homem total e completo”[30], i,é., não poderíamos concebê-lo sem ser nessa unidade[31]. Considerá-lo na sua totalidade é reconhecê-lo como “corpo e alma, não mais, e certamente não menos. Não é só corpo nem só alma, mas os dois juntos”[32].
O homem atinge o Ser por excelência por um processo de ascensão que parte de suas próprias dimensões, ou seja, do corpo se alcança a alma; da alma, a força interior e desta, a potência raciocinante, que se abre à razão e à inteligência[33].  A potência raciocinante é que caracteriza o homem como um animal racional e mortal que tem a primazia sobre toda a criação, por ser capaz de buscar o caminho  da perfeição, da sabedoria e “de ser capaz de receber um preceito”[34]. Ele é visto também como um grande abismo[35], justamente por ser aquele que sempre surpreende na sua relação intersubjetiva.
Em se tratando de intersubjetividade, notemos que o homem é um ser social[36] que vive, no plano ético-político da cidade terrena, chamado a experienciar o Bem,  e cujo fim último é viver segundo a virtude[37].  E não apenas conhecer o que é bom, mas amar o que é bom[38]. É nessa perspectiva que o homem se faz participante da construção da “cidade celeste”.
Abordamos a dimensão do homem social, porque ao  tratar-se do mal, verificaremos que tanto sofre um mal, como faz alguém sofrer. Logo uma das vertentes de abordagem do problema do mal é a vertente social.

4. Alma

Faze que me conheça e que te conheça. (Sol. II,1,1 )
“Desejo conhecer a Deus e a alma e nada mais”. Com esta assertiva, averiguamos a importância da alma no pensamento do Doutor de Hipona. No De Quantitate Animae afirma que saberia dar uma definição à alma sem dificuldade. Diz que a alma  é uma substância dotada de pensamento e capacitada a governar o corpo[39]. Uma coisa é dizer o que é , outra de onde provém.
A origem da alma se constitui num problema. Agostinho nega e refuta a possibilidade da “emanação da substância” de Deus, manifestando-se contra os gnósticos e maniqueus. Do mesmo modo, nega e refuta o “traducionismo materialista” de Tertuliano. Opõe-se à “metempsicose”, descarta a preexistência das almas, doutrina de Platão e Orígenes[40].
Querer conhecer a alma é querer compreender o homem. Este tem primazia sobre toda a criação por ser capaz de buscar a perfeição e a sabedoria. Não seria capaz, senão houvesse a alma, pois “o que interiormente julga da beleza ou da feiura da imagem, é, sem dúvida, superior ao objeto julgado. É a inteligência humana, essência da alma racional, com certeza  incorpórea”[41]. Querer compreender é o desejo da verdade, este é tema sempre constante em Agostinho, revestido com a intencionalidade de procurar a verdade do ser, enquanto alma racional, capaz de entender, guardar conhecimentos e  determinar-se na livre opção.
A essência da alma é ser capaz de Deus para alcançar a percepção da Verdade e para o amor ao bem[42]. É o princípio vivificador que individualiza o sujeito[43]. Portanto, ela tem a supremacia sobre o corpo, pois “uma natureza que dá a vida ao corpo, vale mais do que a natureza à qual a vida foi dada”[44].
Aceitando o princípio bíblico do homem como Imago Dei[45], observamos que isso se faz verdade pelo fato de o homem vir a existir ao receber uma participação do Ser, pois a criação em certo modo se assemelha àquele que cria. O privilégio de ser Imago Dei é exclusivamente da alma [46]. Deste ponto de vista, a existência da pessoa não está condenada a ser presa à vida terrena, mas ela se prolonga até a eternidade, porque a alma é imortal. Esta é uma conclusão de suma importância, pois dá perspectiva escatológica ao homem. A alma não é coeterna com Deus, como afirmam os platônicos, mas começou a existir no tempo e não terá fim[47].
Na obra Soliloquia é examinada a questão da imortalidade da alma, partindo-se de um estudo a respeito  da medida da verdade. Acompanhemos a reflexão : Se a alma foi criada para fruir da Verdade, e a Verdade é imperecível, quer dizer que estando o sujeito na Verdade (que é imperecível), também o sujeito não poderá deixar de existir. Portanto, o sujeito (alma) tem que ser imortal[48].
A alma, afastando-se da Verdade, como bem, e preferindo os bens inferiores, provoca no homem uma reação externa que o leva a agir mal (desordem). Ela não foi criada má, mas tem a possibilidade tanto de  tornar-se perfeita quanto desordenada ou má[49]. Torna-se responsável direta pela ação do homem o que se dá mediante o uso do livre-arbítrio e da liberdade.

5. Liberdade e livre-arbítrio

Quanto melhor e mais certa nossa esperança em Deus, tanto maior deve ser a nossa liberdade.         ( De Civ. Dei III,17)
A criatura racional é destinada à Verdade, ao Bem. Este tender ao Bem é o que se chama libertas. O ser é livre quando tem fruição do Absoluto. Sendo dotado de liberdade, o homem deve  agir moral e eticamente em busca do Bem.
A liberdade acontece, quando há uma adequação da vontade humana à Vontade eterna. Este é o horizonte da plenitude humana. Desse horizonte, passamos ao ambiente das escolhas particulares, onde a liberdade cede o lugar ao liberum arbitrium. Este é a capacitação à escolha do agir tanto para o bem quanto para o  mal. O afastamento do Bem se dá pela vontade, pois é próprio dela escolher o que cada um pode optar e abraçar. E “nada, a não ser a vontade, poderá destronar a alma das alturas de onde domina, e afastá-la do caminho reto”[50].
A volição é dialeticamente relacionada a dois movimentos: o de simples escolha, que corresponde ao livre-arbítrio e o movimento pelo bem, que corresponde à liberdade[51]. O homem ao escolher (arbítrio) o bem, é livre. Escolhendo o que não é o bem, torna-se  escravo.  A escolha,  como ato de liberdade, faz do homem  um  ser aberto à transcendência dos valores. Todavia a partir do momento que há desvio de valor, acontece a “escravização” pela própria escolha. A escolha é desenvolvida pela vontade que é um bem médio, i,é., está entre o Bem supremo e os bens mutáveis[52]. Ela é tão presente em nós que, segundo Agostinho,  “nada se encontra tão plenamente em nosso poder do que a própria vontade”[53].
Analisando a liberdade, deduzimos que consiste, como conquista de espírito, numa abertura do modo de ser à submissão da Verdade[54].  Pois é uma propriedade da razão ser esclarecida pela Verdade. Para isto, precisa contar com o auxílio da “graça” para que o homem possa lutar contra a má vontade.
Sem o livre-arbítrio, não haveria problema, sem a graça, o livre-arbítrio não quereria o bem ou, se quisesse, não poderia consumá-lo. Portanto, a graça não tem por efeito suprimir a vontade, mas tendo esta se tornado má, fazê-la boa[55].
Desde a origem da humanidade, a  liberdade é colocada como um problema. Agostinho deseja alargar os horizontes de compreensão do problema do mal, que tem no livre-arbítrio a sua possibilitação.

III. O PROBLEMA DO MAL

Aversio a Deo  et conversio ad creaturam. ( De Lib. Arb. II,20,54)

1. Origem e causa

Anteriormente, vimos alguns pressupostos necessários à compreensão do pensamento agostiniano a cerca da questão do mal. Estes ajudam a perceber toda a construção do problema, sobretudo a visão de liberdade e livre-arbítrio. Agora, traçaremos a investigação filosófica agostiniana, que se dá na concretude do agir cotidiano.
Agostinho busca respostas ao problema do mal. Chega a fazer-se maniqueísta em busca de solução ao problema. Pretendia conceber o mal como algo substancial, mas sente que esta não é uma via que o conduziria à realidade do mal. Assim, desfaz-se da concepção dual maniqueísta tanto do mal como substância quanto da afirmação de que o mundo era governado pela força do bem e do mal.
Nega a substancialidade do mal, porque vê que todas as coisas são boas enquanto existem, pois têm a sua origem no princípio fundamental que é o Sumo Bem, criador, regedor e administrador do mundo. Mas, mesmo sendo boas todas as coisas, estão sujeitas à corrupção por fazer parte da hierarquia criacional, pois se não estivessem sujeitas à corrupção, seriam imutáveis, perfeitas. Portanto, a sua identificação com o Sumo Bem seria perfeita, ou até mesmo se confundiriam com Ele.
O ser que possui a primazia sobre toda a criação é o homem. Ele por fazer parte da hierarquia criacional, está também sujeito à corrupção, pode optar pelo que é menor em grau de perfeição. Percebendo a fragilidade humana, Agostinho se questiona:
Quem me criou? Não foi meu Deus, que é bom, e é também a mesma bondade? Donde me veio, então, o querer eu o mal e não querer o bem? Seria para que houvesse motivo de eu justamente ser castigado? Quem colocou em mim e quem semeou em mim este viveiro de amarguras, sendo eu inteira criação do meu Deus tão amoroso? Se foi o demônio quem me criou, donde é que veio ele? E se, por sua decisão de sua vontade perversa, se transformou de anjo bom em demônio, qual é a origem daquela vontade má com que se mudou em diabo, tendo sido criado anjo perfeito por um Criador tão bom[56]?
Com reflexões deste tipo, ele dispensa a hipótese de que o mal seja criação de Deus, passando a explicá-lo a partir do homem. Se Deus criou todas as coisas boas, como se dá a origem do mal? Uma coisa é necessário afirmar: todas as coisas são boas por natureza. Pode ocorrer que estejam carentes de algum bem, porque se fosse de todo bem, deixariam de existir[57]. Isto pela inclinação à corrupção.
Eis Deus e eis o que Deus criou! Deus é bom e, por conseguinte, criou boas coisas. E eis como  Ele as rodeia e as enche! Onde está, portanto, o mal? Donde e por onde conseguiu penetrar? Qual é a sua raiz e a sua semente? Porventura não existe nenhuma? Por que recear muito, então, o que não existe? E se é em vão que tememos, o próprio medo indubitavelmente é o mal que nos tortura e inutilmente nos oprime o coração. Esse mal é tanto mais compreensivo quanto é certo que não existe o que tememos, e nem por isso deixamos de temer. Por conseqüência, ou existe o mal que tememos ou esse temor é o mal[58].
Partindo destes pressupostos, Agostinho conclui que o mal não é uma substância[59], pois se assim fosse seria um bem e não um mal. Portanto, o mal nada mais é do que privatio boni, “privação cujo último termo é o nada”[60]. Não existe no Criador, pois é o Sumo Bem. O mal não foi criado por Ele, pois todas as coisas criadas por Ele são boas. E depois, Ele não poderia comunicar o mal ao homem pela criação, pois Ele não possui o mal.
A intuição do mal como privatio, dá-se quando Agostinho tem contato com Eneadas de Plotino que diz que o mal é ausência, falta do bem, mas esta falta e privação do bem é identificada com a matéria[61]. Notamos que “Agostinho aceita a primeira parte da teoria de Plotino, mas não a segunda, ou seja, não identifica o mal com a matéria”[62]. Se o identificasse com a matéria, diríamos  que existiria por si mesmo, o que é um erro. O bem existe por si mesmo, só pelo fato de estar no mundo já é um bem, pois todas as coisas, enquanto existem, são boas[63]. Unde malum[64]?
Os males são superados pelos bens, a ponto de os bens poderam existir sem os males, embora se lhes permita a existência, para ressaltar o bom uso que deles pode fazer a providentíssima justiça do Criador. (...) Por sua vez, os males não podem existir sem os bens, porque as naturezas em que subsistem, como naturezas, são boas. Subtrai-se, pois, o mal, sem subtrair natureza estranha alguma ou parte dela, senão a que fora viciada e corrompida, sanada e corrigida[65].
Agostinho descarta a possibilidade de ser Deus o autor do mal. Assim resta ao próprio   homem  ser aquele que origina o mal, afastando-se do bem imutável e voltando-se ao  bem particular e inferior. Nenhuma realidade é ontologicamente má, mas o mal está em graduar o menor como se fosse superior[66].
O homem afunda (...) à medida que abraça  com mais gosto aquilo a que a sua fraqueza adapta-se com maior facilidade. Começa assim a menosprezar o Ser Supremo, e a não mais julgar como tal tudo o que enganava a sua imprevidência, reduz sua indigência ou atormenta a sua escravidão[67].
A aversio  provém do livre-arbítrio, pela nossa fundamental liberdade – Male facimus ex libero voluntatis arbitrio[68]. Parece haver uma contradição: Se a liberdade é um bem por excelência, como pode ser ela a que propicia a entrada do mal? A liberdade na concepção agostiniana é uma condição da moralidade, e só é possível dizer se algo é bom ou mal na perspectiva da liberdade, porque se uma ação não for realizada na liberdade, esta não deve ser aprovada nem desaprovada. Pois todo ato necessário é dispensado de juízo, o que não ocorre com os atos voluntários, pois podem ser evitados[69].
O homem, pelo livre-arbítrio da vontade, é responsável não só pelas ações que faz, mas também pelas coisas que permite que aconteçam. Isto se dá quando há aversio a Deo et conversio ad creaturam, abandonando-se às paixões, e “nada pode sujeitar o espirito à paixão, a não ser a própria vontade”[70].
Quanto à causalidade do mal, averiguamos que é uma defecção do bem. A causa eficiente do  mal é o afastamento do bem, i.é., melhor dizer que não há causa eficiente, mas sim deficiente[71].
A raiz do mal não está na natureza, mas na vontade desregrada[72]. Ao  referir-se à má vontade, lembremos que a vontade em si mesma é um bem. O mal é uma coisa, a má vontade é outra, ou seja, a vontade é causa e o mal, conseqüência.  O que causa a aversio et conversio não é a natureza, mas a vontade[73]. Vimos que todo ato necessário é isento de juízo, assim, temos que ter o cuidado de não criarmos uma pseudo legitimação, como que se da vontade nascesse o desejo, deste, o hábito que facilmente se transformaria numa necessidade, isentando-se do juízo.
O mal não pode ser pensado como vindo de Deus, pois contradiz a bondade perfeita dele. Analisaremos o problema sobre três níveis:  Ontológico-metafísico ; moral e fisico[74]. Estes níveis não se contrapõe, ao contrário, interdependem-se numa circularidade causal.

2. Nível ontológico-metafísico do mal

A possibilidade de conceber o mal a partir de Deus é descartada. Resta a Agostinho percebê-lo como imperfeição da criatura. Se a perfeição é um bem, logo a imperfeição é uma privatio boni, i.é., negação da existência, pois o bem consiste em ser, portanto, enquanto ser, o mal não existe. Só poderia ser se fosse capaz de ser sem ser no bem, ou seja, ter existência por si mesmo.
Todo ser criado é um  bem em si, mesmo inclinado à corrupção. Mas, à medida que se deixa corromper, vai perdendo não só a sua bondade, mas também a sua realidade. Ora, se considerássemos que as coisas perdendo a sua bondade e ainda continuassem com o seu ser preservado (intacto), num certo momento, tendo perdido a bondade na sua totalidade, ainda continuariam com uma realidade incorruptível. Como sabemos, isto é impossível, pois somente Deus é incorruptível.
Os cultores da lógica estabeleceram uma norma, que afirma que dois atributos contrários não podem ser predicados ao mesmo tempo da mesma coisa[75]. Portanto, em se tratando do bem e do mal não se aplica.
Nenhum corpo pode ser ao mesmo tempo preto e branco, mas alguma coisa pode ser ao mesmo tempo boa e má; com efeito, uma vez que o mal não pode existir a não ser por empréstimo da existência do bem em que inere, não pode haver nenhum mal a não ser que haja ao mesmo tempo bem e mal. Se não existe nenhum bem para o mal diminuir, ele não existe absolutamente[76].
Em suma, o mal não existe no cosmos enquanto afirmação de ser. Existe como privatio boni, e essa privação não será absoluta, senão se tornaria em nada. “O mal não tem natureza alguma; a perda do ser é que tomou o nome de mal”[77]. O nível ontológico-metafísico do mal trata de um sentimento de vazio existencial no homem, i,é., um rompimento com a harmonia do seu ser no ato voluntário ao mal.

3. Nível moral do mal

O mal moral é identificado com o pecado, transgressão do preceito, resultado da “perversão da vontade desviada da substância suprema”[78]. Este desvio se dá pela vontade desregrada, causando assim, todos os males.
Se essa vontade estivesse em harmonia com a natureza, certamente esta a salvaguardaria e não lhe seria nociva. Por conseguinte, não seria desregrada. De modo se segue que a raiz de todos os males não está na natureza[79].
O mal moral, pela vontade, faz emergir a absolutização do que é relativo e relativiza o absoluto. Isto se dá em escolher o inferior e dar-lhe um valor superior, isto é o que Agostinho chamou de aversio a Deo et conversio ad creaturam. A má vontade é causa da transgressão do preceito. A vontade em si mesma é um bem, o que a torna má é o modo com o qual toma resoluções contra a  natureza.
Efetivamente, averiguamos o mal moral nos atos voluntários individualistas e egocêntricos bastante presente na cultura hodierna, onde há buscas de bens mutáveis e de bem-estar individual. O homem, voltado às coisas terrenas, torna-se um ser vicioso dominado pela cobiça e pela soberba, não percebendo que os “bens mundanos não podem trazer a satisfação plena”[80]. Por outro lado, se o homem tem ciência do bem, mas não o faz , então é um desertor do bem, preferindo agir em inadequação moral e ética, com respeito à construção de um espaço de verdadeira liberdade.

4. Nível físico do mal

O mal físico é conseqüência do mal moral, daqui a afirmação anterior de interdependência. A conseqüência se dá pelo fato que se alguém pratica um mal (ação), faz mal a alguém ou a si mesmo. Averiguamos que o mal por ser negação do bem, não tem substância (matéria). Assim, nulla substantia malum est[81], pois o mal está no agir ou no padecer que não são substâncias.
O estilete metálico que possui um lado para escrever e outro para apagar é muito bem feito. A seu modo é belo e adaptado a nosso uso. Se alguém quiser escrever pelo lado que apaga, e apagar pelo lado que escreve, de maneira alguma faria o instrumento tornar-se mal. É a ação feita o mal. E se essa ação for corrigida, onde estará o mal[82]?
O nível físico do mal é observado também quando um corpo sente dores, por exemplo, quando um escravo era açoitado, ele sofria um mal físico como conseqüência do mal moral do seu senhor. Agostinho diz que a “causa primeira da servidão, é, pois o pecado, que submete um homem a outro pelo vínculo da posição social” [83].
O homem prudente (virtuoso) busca aniquilar o mal orientando a outros homens pela elaboração de leis convocando-os ao bem. Vale dizer que “não é mal precisamente por ser proibido por lei, mas é proibido por lei por ser  mal”[84]. Assim procura-se assegurar a tranqüilidade social buscando a concórdia entre os homens. Sumariamente, há distinção entre o mal físico e o mal moral. O primeiro está no plano físico corporal e diz respeito ao sofrimento; o segundo, caracteriza-se pela transgressão voluntária e livre daquilo que é almejado pela ordem natural.

CONCLUSÃO

Na filosofia medieval, o pensamento de Agostinho se destaca pela preocupação com a coerência, isto é,  a  confluência entre o viver e o filosofar. Assim, para compreender a sua filosofia, buscamos uma compreensão da própria figura de Agostinho, uma vez que há integração da vida e do pensamento.
Analisamos alguns pressupostos que nos auxiliaram o desenvolvimento do tema central. Verificamos que Agostinho percorre a via da interioridade para, partindo da alma, chegar ao conhecimento de Deus, como diz Mondin, ele usa o método interiorístico-transcendental.
Na análise agostiniana, Deus  é o criador ex nihilo e princípio fundamental que transcende todo e qualquer ser. O homem, possuidor da primazia sobre toda a criação, é unidade substancial aberto à transcendência na imanência. A alma é uma substância dotada de pensamento e capaz de governar o corpo. A liberdade e o livre-arbítrio são bens em si mesmos, a liberdade assegura a tendência ao bem supremo e o livre-arbítrio assegura a capacidade de escolha.
As concepções acima amparam sua linha de raciocínio na abordagem da   problemática central sobre o mal. Agostinho tem como pano de fundo o príncipio bíblico e parte de um postulado comum ao pensamento grego, segundo o qual, tudo o que existe é positivo, ou seja, toda substância é boa. Logo, o mal não sendo bom, não é substância. A partir disto aceita em parte a doutrina da privatio boni de Plotino,  e passa a refletir o problema numa visão centrada no homem. Nesta visão, a vontade desregrada assume a causa do mal, perpetuando nos níveis do mal ontológico-metafísico, moral e físico.
Alguns pensadores discordam da negação da substancialidade do mal e da definição da privatio boni. Entre eles, Paul Ricouer  e Jung. O primeiro disse que Agostinho nega a substancialidade do mal, confessa que a sua visão é exclusivamente moral. E a questão Unde malum? perde todo o seu sentido ontológico. A questão que a substitui Unde malum faciamus? lança todo o problema do mal na esfera do ato, da vontade e do livre-arbítrio[85]. Para Jung, o mal é extraordinariamente real. Ele considera que a doutrina da privatio boni tende a diminuir a realidade do mal, afirma que o conhecimento se dá pela percepção dos opostos, por isso a considera  como ilógica e irracional[86].  Mencionando P. Ricouer e Jung, quisemos lembrar a atualidade do problema. Estes dois falam por si de atualidade. Refletimos o problema do mal porque acreditamos que sua presença não  é definitiva, mas acreditamos na compreensão e na superação. E isto é um bem.

BIBLIOGRAFIA

AGOSTINHO.  A Cidade de Deus. Contra os Pagãos. Parte I. 4. ed. Trad. Oscar Paes Leme.  Petrópolis: Vozes, 1999.
_____ . A Cidade de Deus. Contra os Pagãos. Parte II. 2. ed. Trad. Oscar Paes Leme.  Petrópolis: Vozes, 1990.
_____ . A Verdadeira Religião. 2. ed. Trad. Nair de Assis Oliveira. São Paulo: Paulinas, 1987.
_____ . Confissões. 9 ed. Trad. J. Oliveira dos Santos e  Ambrósio de Pina.
Petrópolis: Vozes, 1988.
_____ . La Natura del Bene. Trad. Luigi Alici. Roma: Città Nuova, 1998.
_____ . O Livre-arbítrio. Trad. Nair de Assis Oliveira. São Paulo:
Paulus, 1995.
_____ . Sobre a Potencialidade da alma. De Quantitate Animae. Trad. Aloysio Jansen de Faria. Petrópolis: Vozes, 1997.
_____ . Solilóquios. Trad. Nair de Assis Oliveira. São Paulo: Paulinas, 1993.
BIGNOTTO, Newton. O conflito das liberdades: Santo Agostinho. In: Síntese
Nova Fase, BH, v. 19, n. 58, 1992. 327 – 359.
BOEHNER, Philotheus; GILSON, Etienne. História da Filosofia Cristã.Desde as origens até  Nicolau de Cusa. 6 ed. Petrópolis: Vozes, 1995.
COSTA, Marcos Roberto Nunes. O Valor específico do Estado na Doutrina
Ético- política de Santo Agostinho. In: Síntese Nova Fase, BH, v. 25,       n. 81, 1998. 189 - 202.
ELDERS, Leo J. Para una metafisica del mal.  In: Espiritu, Barcelona, v. 47, n.
118, 1998. 217 – 227.
EVANS,G. R. Agostinho – sobre o mal. Trad. João Rezende Costa. São Paulo: Paulus,1995.
GILSON, Etienne. A Filosofia na Idade Média. São Paulo: Martins Fontes,1995, 129 – 158.
HAMMAN, A. Os Padres da Igreja. São Paulo: Paulinas, 1980, 227 – 240.
_____ . Santo Agostinho e seu tempo. São Paulo: Paulinas, 1989.
HIRSCHBERGER, Johannes. História da Filosofia na Idade Média. São Paulo: Ed. Herber, 1966, 29 – 59.
LARA, Tiago Adão. Curso de Filosofia. A Filosofia nos tempos e contratempos da Cristandade Ocidental. Petrópolis: Vozes, 1999, 31 – 43.
MONDIN, Battista. Il Pensiero di Agostino. Filosofia, Teologia e Cultura. Roma: Città Nuova, 1988.
_____ . Curso de Filosofia. Vol. I . São Paulo: Paulinas, 1981, 135-150.
RAMOS, Manfredo Tomás. Ética e Direito em Santo Agostinho ( Um ensaio sobre “A lei temporal”). In: Síntese Nova Fase, BH, v. 25, n. 80, 1998. 107– 132.
REALE, Giovanni; ANTISERI, Dario. História da Filosofia. Vol. I. São Paulo: Paulus, 1990, 428 – 459.
RICOUER, Paul. O Mal – Um desafio à filosofia e à teologia. Trad. Maria da Piedade Eça de Almeida. Campinas, SP: Papirus, 1988.
RUSSELL, Bertrand. História da Filosofia Ocidental e sua conexão política e social desde os tempos primitivos até hoje. São Paulo: Livros Horizonte, 1961, 341 – 353.
SANFORD, John A . Mal – O lado sombrio da realidade. São Paulo: Paulinas, 1988, 162 – 194.




* Sob orientação do Prof. Paulo Augusto da Silva
[1] Cf.  EVANS, G. R.  Agostinho sobre o mal . Trad. João Rezende Costa. São Paulo: Paulus, 1995, 12-13.
[2] É uma pequena cidade da Argélia que corresponde atualmente à Souk-Ahras.
[3] AGOSTINHO. Confissões. Trad. J. Oliveira dos Santos e Ambrósio de Pina. Petrópolis: Vozes, 1988. II, 3.    (As demais referências a esta obra serão feitas com a seguinte abreviatura: Conf.)
[4] Cf. Conf. IX, 9.
[5] Cidade situada na Numídia ( Argélia ), aproximadamente à 24 Km de Tagaste.
[6] Era o centro político e cultural da África Ocidental que oferecia à juventude grandes possibilidades de sucesso mas também muitas tentações. ( Cf. B. MONDIN. Il Pensiero di Agostino. Filosofia, Teologia e Cultura. Roma: Città Nuova, 1988. 13. )
[7] Conf. I, 13.
[8] Cf. Conf. I, 13.
[9] Conf. III, 4.
[10] Maniqueísmo era uma seita fundada por Mani ( ou Manés ), que foi perseguido pelo rei e pelos magos do seu país , a Pérsia. Havia uma mistura das doutrinas de Zoroastro com a do Cristianismo. O ponto principal de sua doutrina era a existência de dois princípios: o do bem e o do mal. O primeiro era Deus e o segundo era Satanás. Asseverava que ambos comunicavam a sua substância aos seres e que o homem era composto de três partes: do corpo, originado do mal; de espírito, originado de Deus; e de alma insensível, cheia de maus desejos e dominada pelo mal. ( Cf. MONDIN. Il Pensiero di Agostino. 16. )
[11] Conf. III, 5.
[12] Cf. Conf. V, 14.
[13] Cf. EVANS. Op. Cit., 38.
[14] Mário Vitorino nascido na África proconsular em torno do ano 300, foi ensinar retórica em Roma por volta de 340 onde travou uma ativa polêmica anti-cristã. Faleceu por volta de 363. ( GILSON, Etienne. A filosofia na Idade Média. São Paulo: Martins Fontes, 1995, 137.)
[15] Cassicíaco, hoje se chama “Cassago de Brianza”, situa-se à distância de 42 Km de Milão. A Quinta foi oferecida por Verecundo, amigo de Agostinho. Permaneceram lá durante um tempo. ( Cf. Conf. IX, 3.)
[16] Hipona, a cidade real, era conhecida por Hippo Regius pelos latinos, é a atual Anabá.
[17] AGOSTINHO. A Verdadeira Religião. 2. Ed. Trad. Nair de Assis  oliveira. São Paulo: Paulinas, 1987. 39, 72. (As demais referências a esta obra serão feitas com a seguinte abreviatura: De Vera Rel.)
[18] Cf. MONDIN, Il Pensiero di Agostino. 89-90.
[19] AGOSTINHO.  Solilóquios. Trad. Nair de Assis Oliveira. São Paulo: Paulinas, 1993. II, 1, 1. (As demais referências a esta obra serão feitas com a seguinte abreviatura: Sol.)
[20] Sol. I, 2, 7.
[21] Conf. VII,10.
[22] Cf. RUSSERL, Bertrand. História da Filosofia Ocidental e sua conexão política e social desde os tempos primitivos até hoje. 9 ed. São Paulo: Livros Horizonte, 1961, 342.
[23] Cf. GILSON, Op. Cit. , 148.
[24] Cf. Conf. X,23.
[25] Cf. AGOSTINHO.  A Cidade De Deus. Contra os Pagãos. Parte I. 4. Ed. Trad. Oscar Paes Lemes. Petrópolis: Vozes, 1999. VIII, 9. (As demais referências a esta obra serão feitas com a seguinte abreviatura: De Civ. Dei)
[26] Cf. De Civ. Dei IV, 27.
[27] Cf. AGOSTINHO.  A Cidade De Deus. Contra os Pagãos. Parte II. 2. Ed. Trad. Oscar Paes Lemes. Petrópolis: Vozes, 1990. XI, 18. (As demais referências a esta obra também serão feitas com a seguinte abreviatura: De  Civ. Dei)
[28] AGOSTINHO. O Livre-arbítrio. Trad. Nair de Assis Oliveira. São Paulo: Paulus, 1995. III, 13, 37. (As demais referências a esta obra também serão feitas com a seguinte abreviatura:De Lib. Arb.)
[29] Cf. De Civ. Dei XII, 23.
Agostinho afirma que o princípio que constitui a excelência do homem é a razão e a inteligência, pois ele é o único ser que existe e que tem consciência de sua existência. ( Cf. De Lib. Arb. I,7,6.)
[30] De Civ. Dei X, 29.
[31] Agostinho frisa a questão da unidade como foi ensinado pela filosofia patrística. A unidade consiste em a alma possuir, usar e governar o corpo, tendo assim a primazia sobre o corpo. (Cf. HIRSCHBERGER, Johannes. História da Filosofia na Idade Média. São Paulo: Ed. Herber,1966,47-48.
[32] De Civ. Dei XIX, 3.
[33] Cf. Conf. VII, 17.
[34] De Lib. Arb. III, 24, 72.
[35] Cf. Conf. IV, 14.
[36] Cf. De Civ. Dei IV, 22.
[37] Cf. De Civ. Dei VIII , 8.
[38] Cf. De Civ. Dei XI , 28.
[39] Cf. AGOSTINHO.  Sobre a Potencialidade da Alma. De Qunatitate Animae. Trad. Aloysio Jansen de Faria. Petrópolis: Vozes, 1997.  XIII , 22.
[40] Cf. O Livre-Arbítrio, p. 289. [ N. T. ]
[41] De Civ. Dei VIII, 5.
[42] Cf. De Civ. Dei XXII, 24.
[43] Cf. Conf. X, 6.
[44] AGOSTINHO. La Natura del Bene. Trad. Luigi Alici. Roma: Città Nuova, 1998. 5.  ( Ao referirmos a esta obra, usaremos somente um número como está impresso na nossa obra.)
[45] Cf. De Civ. Dei XII, 23.
[46] Cf. BOEHNER, Philotheus; GILSON, Etienne. História da Filosofia Cristã. Desde as origens até Nicolau de Cusa. 6 Ed. Petrópolis: Vozes, 1995, 184.
[47] Cf. De Civ. Dei X, 31.
[48] Cf. Sol. II, 13, 23 – 24.
[49] Cf. De Lib. Arb. III, 22, 65.
[50] De Lib. Arb. I, 16, 34.
[51] Cf. MONDIN. Il Pensiero di Agostino. 151 - 152.
[52] Cf. De Lib. Arb. II, 19, 52.
[53] De Lib. Arb. III, 3, 7.
[54] Cf. De Lib. Arb. II, 14, 37.
[55] GILSON, Op. Cit.,155.
[56] Conf. VII, 3.
[57] Cf. Conf. VII, 12.
[58] Conf. VII, 5.
[59] Cf. Conf. IV, 15.
[60] Conf. III, 7.
[61] Cf. MONDIN, Battista. Curso de Filosofia. Vol. I. São Paulo: Paulinas, 1984, 144.
[62] MONDIN, Battista. Curso de Filosofia. Vol. I. São Paulo: Paulinas, 1984, 144.
[63] Cf. Conf. VII, 12.
[64] Conf. VII, 5.
[65] De Civ. Dei XIV, 11.
[66] Cf.  La Natura del Bene 34.
[67] De Lib. Arb. II, 16, 43.
[68] De Lib. Arb. I, 16, 35.
[69] Cf. EVANS, Op. Cit., 114.
[70] De Lib. Arb. III, 3, 7.
[71] Cf. De Civ. Dei XII, 7.
[72] Cf. De Lib. Arb. III, 17, 48.
[73] Cf. RUSSELL. Op. Cit., 347.
[74] Cf. REALE, Giovanni; ANTISERI, Dario. História da Filosofia. Vol. I. São Paulo: Paulus, !990, 455-456.
[75] Cf. EVANS. Op. Cit., 117.
[76] EVANS. Op. Cit., 117.
[77] De Civ. Dei XI, 9.
[78] Conf. VII, 16.
[79] De Lib. Arb. III, 17, 48.
[80] EVANS. Op. Cit., 221.
[81] De Vera Rel. 20, 38.
[82] De Vera Rel. 20, 39.
[83] De Civ. Dei XIX, 15.
[84] De Lib. Arb. I, 3, 6.
[85] Cf. RICOUER, Paul. O mal  - Um desafio à Filosofia e à Teologia. Trad. Maria da Piedade Eça de Almeida. Campinas, SP : Papirus, 1988, 32.
[86] Cf. SANFORD, John  A. Mal – O lado sombrio da realidade. São Paulo: Paulinas, 1988, 174.

DISTINÇÃO ENTRE ÉTICA E MORAL

Conceitos de Ética e Moral com base em filósofos Distinção entre Ética e Moral https://karenelisabethgoes.jusbrasil.com.br/artigos/1452...